Uma força-tarefa do Ministério Público do Trabalho (MPT) identificou 17.661 casos de subnotificação de acidentes de trabalho em um frigorífico da BRF S.A., localizado na cidade de Marau, na região Norte do Rio Grande do Sul. A operação revelou graves irregularidades nas condições de trabalho, gerando a assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) emergencial por parte da empresa.
Além da omissão nos registros de acidentes, os fiscais constataram exigências abusivas feitas aos funcionários afastados por questões de saúde. A BRF, segundo o relatório do MPT, obrigava os trabalhadores a apresentarem receitas médicas ou notas fiscais de medicamentos para validar atestados, e ainda determinava que comparecessem ao setor médico da empresa — mesmo durante o período de afastamento — para que a equipe médica interna avaliasse a veracidade dos atestados.
A fiscalização também identificou 23 trabalhadoras gestantes, incluindo mulheres no oitavo mês de gravidez, atuando em ambientes inadequados e potencialmente prejudiciais à saúde. Outras irregularidades foram detectadas nas linhas de produção, que operavam com ritmo excessivo, ausência de pausas adequadas, grande repetição de movimentos e carregamento manual de cargas, o que eleva os riscos de transtornos musculoesqueléticos e mentais.
Mesmo com a existência de um sistema de rodízio entre funções, a prática foi considerada ineficaz por ser aplicada de maneira inapropriada, sem mitigar os efeitos do esforço repetitivo e da alta demanda de produção.
De acordo com informações fornecidas pela própria BRF, a unidade de Marau realiza o abate diário de 200 mil frangos, resultando em 400 toneladas de carne de frango in natura e 350 toneladas de industrializados. Os trabalhadores operam em dois turnos, das 2h30 às 12h50 e das 13h às 23h, com a sala de cortes iniciando operações duas horas após o abate. O processo de higienização ocorre no turno da noite, das 23h30 às 4h.
Os funcionários têm direito a um intervalo intrajornada de uma hora e três pausas psicofisiológicas de 20 minutos, porém os fiscais apontam que o tempo e a estrutura das pausas não têm sido suficientes para compensar a carga de trabalho intensa.
Em função das irregularidades, o MPT propôs um TAC emergencial, assinado pela BRF, com obrigações imediatas para garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores, especialmente aqueles envolvidos nas áreas de tombamento, salas de massas e misturadoras, além de operadores das linhas BLK, KFC e de produção de salsichas.
As demais irregularidades identificadas seguem sob análise no Inquérito Civil conduzido pelo procurador Pedro Guimarães Vieira, da unidade do MPT-RS em Passo Fundo.
Em nota oficial, a BRF confirmou a assinatura do TAC e afirmou que os ajustes já estão em implementação. A empresa declarou que cumpre a legislação vigente e reafirmou seu compromisso com a saúde e o bem-estar dos colaboradores, destacando seu empenho em promover a melhoria contínua de seus processos internos.
O episódio expõe problemas recorrentes nas condições de trabalho em frigoríficos, setor que historicamente apresenta altas taxas de acidentes e doenças ocupacionais. A ação do MPT serve como alerta para outras empresas da cadeia alimentícia e reforça a importância da fiscalização contínua, do cumprimento das normas trabalhistas e da transparência nos registros de saúde e segurança no trabalho.