Publicada em 2021, a Lei nº 14.128 prevê que profissionais de saúde prejudicados por atuarem no combate à Covid-19 devem ter direito a indenizações caso tenham ficado incapacitados. A legislação, desconhecida por muitos, também abrange reparações aos dependentes de profissionais que vieram a óbito em decorrência da doença.
Quando promulgada, a lei indicava que o poder Executivo iria regulamentar sobre o procedimento de recebimento das indenizações, o que não aconteceu nos anos seguintes. Mesmo sem essa regulamentação, a Câmara de Coordenação e Revisão Cível (CCR Cível) e a Defensora Nacional de Direitos Humanos da Defensoria Pública da União (DPU), Carolina Castelliano, vêm atuando para garantir o direito às indenizações para os vitimados.
Direito
Após atuação do órgão, as interpretações jurídicas em ações julgadas entenderam que é possível entrar com ação judicial mesmo que o Executivo não tenha feito a regulamentação. “É uma lei que existe pouco conhecimento sobre ela. A ausência de regulamentação da lei pelo Executivo não prejudica o exercício do direito”, afirma a defensora pública federal Maíra Mesquita, que também coordena a CCR Cível na DPU.
A defensora argumenta que a demora em regulamentar a matéria não pode prejudicar o exercício do direito pelas vítimas. Orientações e uma petição inicial padrão foram elaboradas pelo órgão para serem utilizados em favor das pessoas que procuram a DPU. A defensoria também emitiu o enunciado 121, apresentando a viabilidade do ajuizamento da ação.
Reforçando esse entendimento, recentemente, a Turma Nacional de Uniformização (TNU) do Conselho da Justiça Federal, ao analisar o Tema 362, fixou que a Lei nº 14.128/2021 é autoaplicável, ou seja, não é necessária uma regulamentação para assegurar o pagamento da indenização. A TNU é o órgão do Poder Judiciário responsável por processar, julgar e unificar a interpretação das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais.
Preocupação
Apesar das iniciativas e da jurisprudência favorável, Maíra alerta que o cumprimento da lei pode estar sendo ameaçado pela demora das vítimas em conhecer e, em seguida, buscar seus direitos. Isso porque a União pode alegar que o exercício do direito prescreve após cinco anos. Em outras palavras, se as vítimas não acionarem o exercício da lei no prazo, é possível que a União se negue ao pagamento dos valores indenizatórios.
Entretanto, a DPU defende que essa tese não se sustenta uma vez que, não havendo como formular o requerimento administrativo perante a União, devido à própria ausência de regulamentação, deve prevalecer o entendimento que prazo prescricional não se iniciou.
Caso concreto
Em agosto deste ano, a Seção Judiciária do Distrito Federal condenou a União a pagar R$ 50 mil aos filhos de uma técnica de laboratório que faleceu em 2020, após contrair Covid-19 no trabalho. Entre os filhos, uma jovem no espectro autista dependia financeiramente da mãe.
A ação foi apresentada em março de 2023 pela DPU e tomou como base a Lei 14.128/2021. Na petição, a DPU criticou a demora. "A deliberada morosidade nessa regulamentação demonstra que não há interesse do Executivo Federal em fazer cumprir a Lei, tanto que tentou inicialmente vetá-la na sua íntegra, o que foi derrubado pelo Congresso Nacional", argumentou o órgão.
Na decisão, o juiz Itagiba Catta Preta Neto declarou que a obrigação da União em fornecer a compensação financeira não exige comprovação de conduta inadequada do Poder Público ou vínculo direto de causalidade, sendo suficiente o cumprimento dos critérios estabelecidos na lei. O valor de R$ 50 mil deverá ser compartilhado entre os herdeiros.
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