Promover um ambiente único com diversas possibilidades de aprendizagem. O Ensino Médio em tempo integral no Rio Grande do Sul vai muito além da experiência de passar mais horas na escola, propondo uma formação diferenciada, que promove conhecimento ao mesmo tempo em que estimula novas habilidades, desperta talentos e prepara o estudante para o futuro.
Entre diretores, professores e alunos gaúchos, a percepção é unânime: não basta apenas passar mais tempo na escola. A proposta é que a instituição de ensino seja um lugar acolhedor, que estimule a socialização, a participação dos alunos e o desenvolvimento de novas ideias. A escola em tempo integral é também um convite ao protagonismo dos jovens, à medida que incentiva a criatividade e a autonomia.
O aluno passa a ser visto também na sua integralidade, valorizando-se não só a fixação dos conteúdos básicos, mas também competências socioemocionais. Com mais tempo disponível, é possível ir além do currículo padronizado e abrir espaço para atividades práticas que cativam o interesse dos jovens. O modelo apresenta uma série de vantagens em relação ao ensino regular e vem gerando impactos positivos não só na educação, mas em várias esferas da sociedade.
O sistema começou a ser implantado no Rio Grande do Sul em 2018, quando 18 escolas passaram a ofertar a modalidade. O projeto avançou pelo Estado e, hoje, já alcança 111 instituições de ensino. Em 2024, ele será ampliado, com a adesão de mais 93 escolas, passando a ser ofertado em 204 unidades educacionais.
Essa abordagem coloca o estudante e seu projeto de vida como centro do modelo pedagógico e traz, além da formação geral básica, componentes curriculares como Projeto de Vida, Mundo do Trabalho, Cultura e Tecnologias Digitais, Protagonismo Juvenil, Estudos Orientados, Iniciação Científica, Itinerários Formativos, práticas experimentais multidisciplinares e aprofundamento com componentes eletivos escolhidos pelos alunos.
A Escola Estadual de Ensino Médio Setembrina, em Viamão, foi uma das primeiras unidades a implantar o modelo, em 2018. Cinco anos depois, a instituição é um dos vários exemplos de que a adoção do tempo integral gera frutos. Atualmente, a escola oferta tanto o Ensino Fundamental quanto o Ensino Médio, atendendo cerca de 500 alunos.
O diretor da Escola Setembrina, Ednilson Roesler, avalia positivamente a adoção do modelo. “A melhor coisa é você conhecer o aluno e poder acompanhar o desenvolvimento do projeto de vida dele. O estudante que chega aqui no primeiro ano do Ensino Médio vem com muitos sonhos, e o melhor é você poder trabalhar isso junto com ele. No final do terceiro ano, é possível perceber como eles cresceram. Esse tempo a mais é justamente para isso: você acompanha o projeto do aluno e vê que a construção está dando certo”, afirmou.
A proposta da escola é trabalhar, ao longo do ano, três grandes projetos, que engajam os alunos, promovem a integração entre as turmas e mobilizam toda a comunidade escolar: a Multifeira; o projeto Brasil, mostra tua cara; e uma apresentação teatral.
No primeiro trimestre, a escola realiza a Multifeira, desafiando os alunos a desenvolverem projetos de iniciação científica; no segundo trimestre, é a vez do Brasil, mostra tua cara, projeto em que os eles expressam, por meio da música, a influência de diversos povos na formação do Brasil. No terceiro trimestre, os estudantes preparam uma apresentação teatral baseada em uma obra literária que eles mesmos escolhem.
Parte do tempo dentro da escola é utilizado para construir e desenvolver cada um dos projetos. Eles conseguem ensaiar, preparar cenários, figurinos e tudo que for necessário para o momento em que apresentam os resultados. “Tempo integral não significa somente ocupar as horas do aluno dentro da escola. Queremos entendê-lo na sua integralidade: na emoção, na inteligência e na capacidade intelectual de desenvolver o seu próprio conhecimento”, acrescentou o diretor Ednilson.
Na Escola Governador Walter Jobim, também em Viamão, que implementou o modelo em 2023, o tempo integral também vem estimulando o protagonismo juvenil. A partir da iniciativa dos próprios alunos, a instituição vem trabalhando diversas temáticas que se apresentam como problemas do mundo contemporâneo.
“Tivemos o exemplo do Interescolar, um campeonato esportivo organizado pelos alunos com a finalidade de trabalhar a imagem que as pessoas têm da escola, convidando outras instituições de ensino para participarem da competição. Foi um sucesso e, para nós, um símbolo do protagonismo deles. Houve também outras ações, que desenvolveram temas como a beleza negra e o bullying. Os alunos procuram entender as problemáticas que estão postas dentro da escola e fora dela para, então, proporem as soluções”, contou o diretor da escola, William Sodré.
Na Walter Jobim, há também uma horta, que é cultivada pelos próprios alunos. Eles cuidam de todo o processo até a colheita. Os alimentos são utilizados na cantina da escola. De acordo com Sodré, como a escola está localizada em uma região marcada pela vulnerabilidade social, a adoção do tempo integral também tem se mostrado eficaz para manter os jovens longe da criminalidade.
O Instituto Estadual de Educação Sapiranga também foi uma das escolas pioneiras na implantação do tempo integral no Estado. Para o diretor da unidade, Émerson Vecchietti, o modelo busca formar alunos ativos e protagonistas do próprio aprendizado. “Temos experiências de alunos extremamente tímidos que hoje se apresentam para um auditório lotado. O espírito de liderança e iniciativa dos nossos estudantes, comparado com as escolas parciais, é muito maior. Não formamos alunos para uma profissão apenas, mas para o mundo, para que saibam interagir e buscar soluções para os problemas”, ressaltou.
Na Escola Estadual de Ensino Médio Senador Salgado Filho, em Alvorada, a aprendizagem não se restringe às salas de aula. “É possível estudar matemática e várias outras disciplinas num espaço de prática diferente. Utilizamos uma metodologia muito diversificada. Começa pela estrutura: os laboratórios de matemática, de ciências, de robótica e de física, além da sala de música. Temos também uma sala de arte ao ar livre que pode ser aproveitada em dias de tempo limpo. O nosso laboratório de informática também é muito utilizado”, ressaltou a diretora da escola, Karen Soares.
Um dia na Setembrina
A orientação principal na Escola Estadual de Ensino Médio Setembrina é criar um espaço atrativo para os estudantes. “A sala de aula é um espaço maravilhoso de conhecimento, mas ele não pode ficar fechado. Ele tem que se abrir para outros espaços da escola”, disse Ednilson.
A Escola Setembrina proporciona estudos de ciências, robótica e arte. Conta com salas maker (ambientes voltados ao aprendizado prático e criativo), sala de arte e um pavilhão, além de um grande palco, onde são desenvolvidos projetos educativos.
A rotina começa cedo e só termina no final da tarde. Os alunos ficam 9 horas dentro da escola. Ao longo do dia, eles fazem quatro refeições na instituição de ensino. A convivência é bastante intensa, o que fortalece os vínculos entre os alunos e os demais integrantes da comunidade escolar.
A aluna do 2º ano do Ensino Médio, Ângela Costa, 17 anos, contou como é a rotina de quem estuda numa escola em tempo integral. “Por volta das 7h15, a escola já abre os portões para os alunos entrarem. Muitos tomam café na escola. Temos cinco períodos de aulas pela manhã, a partir das 8h, e mais quatro períodos no turno da tarde. O café é servido às 7 horas. O almoço, ao meio-dia. Um lanche, às 10h e outro lanche às 15h. E saímos às 17 horas”, relatou.
É na hora do almoço que, muitas vezes, os professores conseguem conversar com os alunos e perceber aspectos que ultrapassam os limites da sala de aula: os educadores dialogam sobre as necessidades, projetos, sonhos, desafios e o que os estudantes estão buscando dentro da escola.
A professora de matemática Milena Rocha, que trabalha na Setembrina há 11 anos e acompanhou a transição vivenciada pela instituição ao adotar o tempo integral, avalia os resultados: “A principal mudança que eu noto é a ampliação da visão que a gente tem dos alunos. No ensino regular, a gente não tem esse tempo para observar o desenvolvimento deles. No tempo integral, a gente consegue ter uma visão do todo, incluindo os aspectos sociais e afetivos. Eu avalio como muito positivo esse estar na escola e poder ir muito além do aspecto do conhecimento científico”.
No local, os alunos põem em prática todas as tarefas, desde as mais comuns na rotina escolar até as interdisciplinares. Com isso, eles não precisam levar um amontoado de tarefas para casa, porque quase todas as atividades são realizadas dentro da própria escola, com o acompanhamento de um professor.
A aluna do 2º ano do Ensino Médio, Laura Dias, 17 anos, mora em Porto Alegre, mas escolheu estudar na Setembrina, em Viamão, por ser uma escola integral e que oferece educação de qualidade. “Eu fico uma hora no ônibus, mas eu sabia que a escola era muito boa e que iria me ajudar também no meu futuro. Eu gosto bastante da escola. Por mais que seja cansativo, é algo que me ajuda muito em relação a me conhecer melhor e a expressar minha opinião sobre as coisas”, afirmou.
Texto: Juliana Dias/Secom
Edição: Secom
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