O projeto de flexibilização das regras de compensação ambiental sugerido pelo vereador Anderson Zanella (PP) parece enfrentar dificuldades para seguir em frente. A matéria - que era para ter entrado em votação ainda na sessão da última segunda-feira, 19 - foi derrubada pela equipe Jurídica da Casa Legislativa e isso fez com que os ânimos se exaltassem na Câmara Municipal. Além disso, a área de licenciamento da Secretaria do Meio Ambiente também não concorda com as alterações.
O objetivo do projeto sugerido pelo vereador Anderson Zanella (PP) é flexibilizar as regras de compensação ambiental da lei nº 4000/2006 para aqueles que forem notificados pela Secretaria do Meio Ambiente em situações que tenham cometido o crime de desmatar uma vegetação nativa.
No primeiro documento enviado, o parlamentar colocou que seria diminuído o número de árvores que deveriam ser plantadas, de 15 para 10; o prazo para a realização do plantio aumentaria para dois anos em vez de um ano e subiria a porcentagem de falhas permitidas de 10% para 20%, porém não colocou que ampliaria o espaço de plantio, deixando de ser exclusivamente em Bento Gonçalves para todas as áreas da região pertencentes a Bacia hidrográfica do Rio Taquari - Antas, então, o vereador enviou uma emenda substitutiva em que destacava a ampliação da área de plantio, contudo não colocou as outras alterações que havia sugerido no arquivo anterior.
Na sessão da Câmara de Vereadores desta segunda-feira, 19, o projeto de Zanella era para ter entrado na Ordem do Dia, mas isso não aconteceu, desta forma, o vereador usou seu momento na tribuna para mostrar a sua indignação sobre a situação. "Desde quando assumimos a presidência da Comissão de Infraestrutura nesta Casa, temos bastante dificuldade e inúmeras reclamações dos colegas vereadores com os despachos do departamento jurídico desta Casa. Muitas vezes reclamamos aqui da burocracia do poder público. Muitas vezes nós somos cobrados porque burocratizamos o serviço público e o que nós enxergamos, muitas vezes, é uma burocracia interna desnecessária por irresponsabilidade, falta de aperfeiçoamento e acompanhamento das matérias nesta casa. Eu digo isso, porque estaríamos votando aqui hoje o PLO 51, que é a flexibilização dos processos ambientais. Esse processo tramitou na casa por mais de 30 dias, o último relator da comissão deu parecer sem orientação técnico-jurídica. O regimento interno no seu artigo 58 diz que: após lida a matéria pela mesa, o departamento jurídico tem quatro dias úteis para emitir a orientação, passaram os 30 e não foi feito," destaca Zanella.
Conforme explicado pelo vereador em entrevista ao NB Notícias, o Departamento Jurídico colocou que foram mudados dois artigos da Lei em um mesmo documento e deveria ter sido feito apenas uma alteração, mas que poderia ser apresentado um projeto substitutivo no dia da votação sem a necessidade da matéria voltar para correção de acordo com o regimento interno da Casa Legislativa. "Foi uma falta de interpretação do próprio regimento que diz que poderia ter ido para a pauta e na sessão ser apresentado um projeto substitutivo," esclarece Zanella. O parlamentar também frisa que a crítica não é para todo o setor e sim para um servidor. "Minha crítica é apenas para um servidor que, na minha opinião, está pessoalizando os projetos," esclarece Zanella.
Com toda essa situação, o vereador enviou novamente o projeto, agora como substitutivo e com todas as alterações sugeridas. Confira abaixo:
Art. 1° Altera o § 4° do Art. 61 da Lei Ordinária n° 4000, de 29 de setembro de 2006, que passa a vigorar com a seguinte redação:
"§ 4° Além de outras formas de composição ambiental que possam ser exigidas dos proprietários da vegetação nativa sujeita a corte, para cada árvore cortada, deverão plantar 10 (dez) mudas nativas, preferencialmente das mesmas espécies, com replantio obrigatório dentro de 02 (dois) anos, sendo permitido o máximo de 20% (vinte por cento) de falhas, comprovado mediante laudo técnico e vistoria da municipalidade. A reposição será feita mediante o plantio de, no mínimo, 1/3 (um terço) de essências nativas, preferencialmente, no Município de Bento Gonçalves ou no perímetro da bacia hidrográfica do Rio Taquari — Antas, em imóvel público ou privado, desde que haja anuência do dono do terreno, com a devida comprovação no órgão competente. (NR)
Art. 2° Acresce o inciso IV ao §3° do art. 61 da Lei Ordinária n° 4000, de 29 de setembro de 2006, com a seguinte redação:
"IV- Por interesse do proprietário, mediante prévia compensação ambiental, nos termos da lei."
Entretanto, a área de licenciamento da Secretaria do Meio Ambiente emitiu um documento, o qual foi recebido pela reportagem do NB, onde destacam os motivos pelos quais a lei não deve ser aprovada. O primeiro deles é que não seria correto a diminuição do plantio de 15 para 10 árvores e que isso poderia burocratizar ainda mais o serviço:
O Município possui Termo de Cooperação SEMA/Departamento de Biodiversidade - Município de Bento Gonçalves nº 004/2018 e através dele foi delegada competência para licenciamento e fiscalização florestal. Devido a esse vínculo, o Município segue a Instrução Normativa SEMA nº 001/2018. No art. 4º da referida IN consta que: “Nos casos de compensação por plantio de mudas, a quantificação da RFO deverá ser efetuada com base no volume da matéria-prima florestal gerada e no número de árvores a serem suprimidas, considerando os dados dendrométricos, a extensão da área de manejo, e quando se tratar de compensação ambiental por área equivalente a estrutura e o estágio sucessional das florestas nativas.
§ 1º O cálculo do número de mudas para a RFO, originado de licenciamento para corte de vegetação nativa, dar-se-á no montante de 15 (quinze) mudas para cada exemplar de árvore nativa suprimida, com diâmetro à altura do peito (DAP) igual ou superior a 15 (quinze) centímetros.
§ 2º O cálculo do número de mudas para a RFO, originado de licenciamento para corte de vegetação nativa que apresentam diâmetro à altura do peito (DAP) inferior a 15 (quinze) centímetros dar-se-á no montante de 10 (dez) mudas por estéreo (st) de lenha a ser gerado.
§ 3º Não será exigida a RFO para os casos em que a supressão da vegetação nativa não gere matéria-prima lenhosa em ambientes florestais”.
Dessa forma, não acreditamos ser possível a alteração do plantio de 15 para 10 mudas por árvore cortada. O Município possui o Termo de Cooperação SEMA/Departamento de Biodiversidade - Município de Bento Gonçalves nº 004/2018. Este instrumento pode vir a ser questionado em caso de contrariedade às normas estaduais, com possibilidade do licenciamento e fiscalização florestal do Município voltarem a ser de competência do Estado, burocratizando o licenciamento ambiental, tendo em vista que o cidadão teria que realizar a solicitação ao Estado, processo bastante moroso.
Outro ponto destacado foi o da porcentagem de falhas:
No art. 18 da referida IN consta: “A quitação final do compromisso da compensação por plantio de mudas, só se dará após o 4º (quarto) ano de manejo e com a plena garantia do estabelecimento das árvores, admitindo-se percentual máximo de 10 % (dez por cento) de falhas”. Assim, não acreditamos ser possível a alteração do percentual máximo de falhas de 10% para 20%.
O tempo sugerido de plantio:
Quanto ao prazo para a compensação através do plantio de mudas, consideramos que 01 (um) ano é suficiente para o requerente realizar o plantio, sendo que os dois anos propostos apenas prolongam a implantação das medidas que minimizam os impactos ambientais, atrasando os ganhos ambientais e tornando moroso o fim do processo de licenciamento ambiental.
A questão da liberdade do plantio em outros imóveis que não sejam em Bento Gonçalves:
Quanto à proposta de inclusão do inciso IV ao § 3º do art. 61º, julgamos tal inclusão inadequada, pois entendemos que o corte e/ou a poda de vegetação nativa deva ser concedido apenas quando haja uma motivação coerente, e não simplesmente por vontade do requerente. Conforme firmado no art. 225 da Constituição Federal do Brasil, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Entendemos que a autorização de manejo de vegetação nativa sem uma justificativa plausível vai contra o que prega a Constituição, colocando em risco a biodiversidade local.
E para finalizar, colocam os motivos do por quê não concordam sobre a flexibilização do plantio em outras cidades e não em Bento Gonçalves, onde o crime foi cometido:
As compensações ambientais são vistoriadas a fim de verificar estágio sucessional da vegetação (quando compensação por averbação em matrícula de área equivalente) e o estado fitossanitário das mudas plantadas (quando compensação por plantio de mudas). Dessa forma, o corpo técnico do licenciamento ambiental e/ou fiscais ambientais do Município terão que se deslocar a outros municípios a fim de fiscalizar essas compensações ambientais, ato que não se sabe sobre a legalidade. Presumindo que essas vistorias sejam legais, o Município seria onerado, tendo em vista gastos com diárias e gasolina. Ainda, seria necessária concordância/convênio com outros municípios da bacia Taquari-Antas quanto ao recebimento de compensação ambiental, o que burocratiza ainda mais o processo de licenciamento ambiental.
No art. 17 da Lei Federal 11.428/2006 consta que “O corte ou a supressão de vegetação primária ou secundária nos estágios médio ou avançado de regeneração do Bioma Mata Atlântica, autorizados por esta Lei, ficam condicionados à compensação ambiental, na forma da destinação de área equivalente à extensão da área desmatada, com as mesmas características ecológicas, na mesma bacia hidrográfica, sempre que possível na mesma microbacia hidrográfica, e, nos casos previstos nos arts. 30 e 31, ambos desta Lei, em áreas localizadas no mesmo Município ou região metropolitana”. Ou seja, nos casos de supressão de vegetação para fins de loteamento ou edificação a compensação ambiental deve ocorrer no mesmo Município ou região metropolitana.
Acreditamos que a compensação ambiental oriunda de manejo de vegetação em um município deve ser realizada no próprio município, tendo em vista o desenvolvimento sustentável, ou seja, aquele que satisfaz as necessidades da geração atual e não compromete as necessidades de desenvolvimento das gerações futuras. Devido aos desmatamentos de nosso município, já identificamos efeitos negativos para a fauna, que acabam utilizando áreas urbanas para dessedentação, alimentação e descanso, o que acarreta em morte devido a atropelamentos e ataque de cães domésticos (...). Caso as compensações ambientais não ocorram mais no município, situações como a relatada serão agravadas, uma vez que resultaria na diminuição de habitat desses animais.
Com todas essas argumentações, a área de licenciamento da Secretaria do Meio Ambiente solicitou a revisão de toda a lei nº 4000/2006, com o apoio da comunidade. Questionamos o vereador sobre o documento, o mesmo alegou que não havia recebido e que a lei sugerida ainda poderia ter alterações.