Equilíbrio, concentração, habilidade e, sobretudo, ousadia são alguns dos requisitos que resultam no domínio da bicicleta, com a qual atletas do BMX Freestyle promovem um verdadeiro espetáculo de acrobacias e manobras em skate parks. A modalidade estreou nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021, o que fez crescer consideravelmente o esporte no Brasil. Em Bento Gonçalves, a expansão do BMX Freestyle se comprovou neste ano com o primeiro evento oficial voltado ao esporte na cidade.
A origem do BMX (Bicycle Moto Cross) se deu nos Estados Unidos como uma “cópia” do MotoCross, porém com um equipamento mais acessível aos admiradores do esporte. Portanto, bicicletas passaram a ser utilizadas em pistas de terra, nascendo o BMX. O esporte ingressou ao quadro olímpico nas Olimpíadas de Pequim 2008, porém na modalidade “Supercross”, com corridas em pistas de diversos obstáculos. O Freestyle, por sua vez, estreou somente nas Olimpíadas de Tóquio.
O BMX Freestyle (estilo livre, no português) consiste em apresentações individuais de um minuto, nas quais os atletas devem realizar manobras com diferentes graus de dificuldade para pontuarem. Quem tiver as notas mais altas é o vencedor.
Em Bento Gonçalves, o atleta Cassiano Galves é um dos mais experientes da cidade, o qual pratica a modalidade desde 2003, tornando-se um dos maiores fomentadores do esporte no município. “Antigamente era tudo mais difícil. Não tinha estrutura, eu não tinha muito equipamento, não tinha muitas condições de andar por conta do alto investimento com peças, mas o amor pelo esporte fez com que eu continuasse praticando até hoje”, detalha.
Cassiano chegou a disputar etapas do Campeonato Estadual de BMX e, aos poucos, foi conhecendo outros atletas que compartilham da mesma paixão pelo esporte. “Aos poucos fomos adquirindo maturidade e conseguindo ter mais condições de levar o esporte para frente. O primeiro evento de BMX em Bento foi memorável e era algo que queria ter feito há muito tempo”, pondera.
O experiente atleta foi um dos organizadores do 1º Campeonato de BMX Freestyle de Bento Gonçalves, que reuniu cerca de 70 atletas das mais diversas partes do Estado, inclusive contando com um colombiano entre os competidores.
“Lá em 2003 sonhávamos muito com isso. Não tínhamos condições de ampliar os horizontes e poder mostrar esse esporte para todo mundo. Atualmente temos mais condições. Com o apoio da Bahrulho, da Next, conseguir fazer esse evento foi maravilhoso. Sem verba pública, sem nada, só com força de vontade. Fiquei muito feliz, pois em 2003 sonhava com isso e hoje, em 2023, tornou-se uma realidade. É uma coisa que ficará para a nova geração”, explica.
Um dos atletas que está levando o nome de Bento Gonçalves nas competições estaduais e regionais de BMX Freestyle é o atleta Igor Carvalho, de 21 anos, o qual iniciou sua trajetória na modalidade com apenas 13 anos de idade. “Conheci a modalidade aqui na praça vendo o pessoal praticando. Foi paixão à primeira vista”, comenta.
Sem patrocínios, Igor tira do próprio bolso o montante para arcar com custos como deslocamento, alimentação, hospedagem, equipamentos da bicicleta e saúde. A jovem promessa do BMX Freestyle de Bento Gonçalves tem o sonho de se tornar um atleta profissional. “Quero evoluir bastante, chegar ao nível profissional, conquistar os meus patrocínios e, se possível, um dia, viver só do esporte”, pondera.
Dentre os atletas desta nova geração, e que esteve presente no evento, está o gaúcho Henrique Viegas Espinoza, de apenas 15 anos, o qual herdou de seu pai, Maurício Alex, de 53 anos, a paixão pelo BMX e, atualmente, participa de competições estaduais, nacionais e, também, de nível internacional.
Henrique iniciou a praticar a modalidade com apenas oito anos de idade. Com o apoio do pai, o qual está junto em todas as competições que o filho atua, o atleta de Esteio passou a se destacar nos campeonatos. Em 2022, a jovem promessa foi vice-campeã do Campeonato Brasileiro, em Maringá-PR. Em dezembro do ano passado, Henrique competiu pela primeira vez em um evento internacional de BMX Freestyle, no Centro de Treinamento do BMX, em São Paulo-SP. “Foi muito legal ter a experiência em competir neste lugar. Cada pista é uma experiência nova e aprendo várias coisas”, comenta.
A competição era válida para o ranking mundial da modalidade, no qual serão definidos os atletas que vão atuar nas próximas Olimpíadas. Porém, antes de pensar em atuar no maior evento do esporte do mundo, Henrique quer alcançar o nível profissional na modalidade. “Meu sonho é ser um piloto profissional, andar em vários lugares do mundo, correr nos campeonatos internacionais para ter a experiência de vivenciar isso tudo com os melhores atletas”, ressalta.
Se no começo o pai o auxiliava nos treinamentos para a composição de manobras e do domínio da bicicleta, hoje quem ensina é o filho. “No começo ele (pai) me ensinou muita coisa, agora sou eu quem ensino ele”, comenta.
Dentre suas inspirações no BMX está o atleta Wandernberg da Silva Maia, conhecido popularmente como Ceará, o qual pratica a modalidade desde os 14 anos. Natural de Fortaleza-CE, o atleta está no Rio Grande do Sul há 15 anos, e participa de torneios e competições na categoria profissional. “O Henrique é um que estou sempre puxando a orelha dele. No último campeonato que competimos juntos, em Charqueadas, fiquei em quarto e ele em quinto, e ele veio a viagem todinha me incomodando, dizendo que quase ganhou de mim, e para mim, se ele tivesse ganhado ficaria muito feliz, é um guri que está se puxando, está evoluindo e quero vê-lo um dia na TV, atuando com os melhores”, pondera Ceará.
Ceará, que conta com vasta experiência na modalidade, inclusive em São Paulo-SP, onde o esporte está centralizado no que tange o BMX profissional, afirma que a falta de infraestrutura no Rio Grande do Sul atrasa o fomento do BMX e, por consequência, a formação de futuros atletas. Em Porto Alegre, por exemplo, praticantes do esporte não podem usufruir da maior pista de skate da América Latina, o que causou um amplo debate, uma vez que a proibição encanteia a modalidade.
“O BMX não quebra pista. Temos pilotos de Porto Alegre que precisam ir embora para São Paulo para treinar para competir em Panamericanos. Aqui fica muito trancado essa questão por não termos espaço para treinar. Está faltando infraestrutura para todos estarem treinando e poderem, quem sabe, subir e competir a nível nacional e internacional”, analisa Ceará.
Demanda do esporte em Bento Gonçalves:
Em Bento Gonçalves, conforme Cassiano Galves, a estrutura disponibilizada por meio das pistas da Praça Centenário e do Ouro Verde atendem à demanda dos atletas que praticam a modalidade, porém com limitações. O novo projeto do skate park da praça Centenário também será destinado para o BMX Freestyle, sem nenhuma restrição.
Na cidade, o fomento do esporte esbarra na falta de apoio e nas limitações estruturais. “Nosso esporte está bem de lado, tanto o skate como o BMX, que são modalidades fortes aqui na pista. Dificilmente temos apoio, porém é um esporte em crescimento. Hoje em dia o pessoal não anda muito por não ter estrutura. Parei de praticar a modalidade por não ter condições e não ter uma estrutura para poder andar. Dependia muito de sair de Bento para ir em outras cidades praticar. Se tivéssemos uma estrutura melhor com certeza teríamos mais atletas, inclusive levando o nome da cidade em competições Brasil afora.
Cassiano almeja constituir uma associação para que, junto à prefeitura, a modalidade consiga verbas para a ampliação do fomento do esporte em Bento Gonçalves. Dentre um dos objetivos após a formação da entidade é reivindicar uma reforma na pista da praça Ouro Verde. “É uma pista que tem muita condição, tem grandes chances de fazer uma boa ampliação nela, aumentando o grau, os obstáculos e poder, desta forma, fazer uma ótima pista para treino. Vai ser uma coisa não só para o BMX como também para o skate", destaca.
Características da bicicleta para BMX:
A bicicleta de BMX se caracteriza por ser menor, leve, resistente e de pequeno porte, com rodas aro 20 e com apenas uma marcha e um freio (na roda de trás), além de apresentar um quadro resistente para aguentar o impacto dos saltos.
O investimento para praticar BMX é inferior a outras modalidades do ciclismo, dependendo do nível de competitividade que cada atleta almeja alcançar. “Hoje em dia temos peças nacionais e importadas que conseguimos, aí vai depender do bolso e da preferência da pessoa. Se o atleta quer uma bike mais iniciante vai depender da forma que ela vai querer montar a bike. Hoje em dia a pessoa que quer começar a andar consegue comprar uma bicicleta por um preço baixo. O equipamento também é possível fazer um combo. É uma modalidade bastante acessível”, explica Cassiano.
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