As chances são muito pequenas, mas o homem que esfaqueou o presidente da República Jair Messias Bolsonaro em 2018 pode deixar a cadeia pela porta da frente ainda no mês de julho. Adélio Bispo de Oliveira será submetido a uma perícia psiquiátrica em que ele terá seu estado mental novamente avaliado. Se os médicos atestarem que ele não representa mais perigo, para si ou outras pessoas, Adélio poderá até mesmo deixar a Penitenciária Federal de Campo Grande (MS).
Apesar de ter passado desde 2018 no presídio, época em que esfaqueou Bolsonaro em Juiz de Fora, Adélio não cumpre pena, pois não foi condenado pela tentativa de homicídio. Em 2019, ele foi absolvido após ser considerado inimputável, em razão do diagnóstico de “Transtorno Delirante Persistente”, uma doença que, segundo a sentença, o impedia de entender que estava cometendo um crime e, com isso, determinar, por sua própria vontade, uma conduta oposta.
Nesta decisão, de junho de 2019, o juiz do processo, Bruno Savino, de Juiz de Fora, ordenou que ele ficasse internado por tempo indeterminado, mas que fosse reavaliado em três anos, prazo que venceu no mês passado. A perícia só não foi realizada até o momento pela dificuldade de encontrar psiquiatras dispostos a fazer a avaliação.
Após mais de um mês de tentativas, a Justiça Federal conseguiu, com a colaboração de Associação Brasileira de Psiquiatria, designar dois profissionais para o procedimento, que será bancado pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), vinculado ao Ministério da Justiça e que administra os presídios federais.
Caso seja constatado que ele está 100% curado, Adélio poderá ir para a casa e terá liberdade para circular livremente pelas ruas, segundo o advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, que defendeu Adélio no início do processo e hoje responde como seu curador, ou seja, o responsável por cuidar de seus interesses na Justiça. “Esses peritos vão analisar se houve alguma melhora, se houve a convalescência [recuperação da doença] total ou parcial, o quadro de saúde. O perito vai juntar isso e falar se ele pode sair da medida de segurança detentiva para a restritiva. Ou seja, ao invés da internação, se ele pode fazer um tratamento ambulatorial em casa, em que teria de ficar alguém, uma enfermeira ou pessoa da família, responsável pela medicação”, explicou o advogado.
A decisão final caberá a um juiz de Campo Grande, que supervisiona a internação. Zanone entende que o melhor para Adélio é que ele continue no presídio de segurança máxima. “Eu sou a favor que ele continue no sistema federal, porque ele já foi ameaçado de morte no sistema estadual. Para mim, hoje, o Adélio na rua, no atual cenário político, com os ânimos acirrados, eleição se avizinhando, o Brasil é pequeno para ele”, finalizou Zanone.
Investigação na Polícia Federal continua
Fora a indefinição sobre a permanência ou não no presídio, ainda ronda o caso de Adélio a dúvida sobre a participação de terceiros ou a existência de um mandante para o atentado contra Bolsonaro. Dois inquéritos da Polícia Federal já concluíram que ele agiu sozinho, mas uma nova frente de investigação, reaberta no fim do ano passado e ainda inconclusa, busca revelar quem pagou pelos serviços de Zanone Manuel de Oliveira Júnior.
O advogado sempre disse que foi uma pessoa ligada à igreja evangélica que Adélio frequentava em Montes Claros (MG), sem dar muitos detalhes nem identificar esse patrocinador.
Diretamente interessados na questão, o presidente Jair Bolsonaro e seu advogado pessoal, Frederick Wassef, conseguiram, no ano passado, derrubar uma decisão que impedia a análise de material apreendido pela PF em locais de trabalho de Zanone. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ainda tenta reverter essa decisão no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília, alegando que o procedimento afronta o sigilo profissional de advogado com cliente.
Zanone não soube informar se o material que foi apreendido em seu escritório já foi periciado. O delegado Martin Bottaro Purper, que passou a tocar a investigação, tem experiência em investigações de homicídios e já coordenou ações contra o Primeiro Comando da Capital (PCC), maior facção criminosa do país, nascida em presídios paulistas.
Bolsonaro e Wassef sustentam que Adélio não tem problemas mentais, e que agiu como um terrorista a mando de alguma organização criminosa ligada à esquerda para assassinar o então candidato. A reportagem apurou que a defesa do presidente poderá requerer a participação de peritos assistentes para acompanhar a avaliação psiquiátrica, prevista para o fim deste mês, e verificar o resultado da avaliação oficial.