Mais uma obra supostamente irregular levantou suspeitas e gerou denúncias em Bento Gonçalves, envolvendo tanto desmatamento como o desvio do curso de um arroio em um local que seria Área de Preservação Permanente (APP). A reportagem do NB Notícias foi acionada por vizinhos do terreno, que dizem que as intervenções vêm sendo realizadas há mais de dois anos, mas ganharam força em 2022, com o aterramento do lote e a colocação de tubos que serviriam para canalizar o riacho.
De acordo com o relato de Raul Mazzola Medin, que reside nas proximidades há 25 anos, o espaço pertenceu por décadas a uma família, mas há pouco tempo foi vendido. "É uma área que sempre foi preservada, respeitada. Aí, de repente, vem um bacana aqui, compra essa área e resolve aos poucos ir desmatando, vai destruindo a vegetação. A última tacada então é essa: resolveram canalizar o arroio que tinha lambari, traíra, jundiazinho. Eu, inclusive, pesquei aqui muitas vezes. Isso aqui era um bosque fechado, tinha saracura, tinha aracuã, tinha até cutia. Era um corredor de animais. Isso que estão é fazendo é um precedente que está sendo aberto para quem está esperando uma oportunidade para desmatar, vão ver isso aqui e pensar que está tudo liberado", lamenta.
Medin conta que, por várias vezes, denúncias foram levadas à prefeitura, mas que nunca resultaram em nada concreto. Nesta segunda-feira, dia 4, contudo, a máquina que trabalhava no local operou somente até o meio-dia. À tarde, além da reportagem, a Patrulha Ambiental (Patram) e a Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smmam) estiveram no lugar para averiguar a situação. "A primeira vez que a gente fez a denúncia também veio o pessoal de Meio Ambiente, mas, pelo que vi, eles vieram aqui para endossar o crime. Será que o geólogo que liberou isso aqui conhece o leito desse rio, sabe onde é a nascente desse rio, quanto quilômetros acima nasce esse arroio? Ele não sabe, não levantou a bunda da cadeira para vir olhar isso aqui e liberou. Onde nós vamos parar, qual é o futuro que nós queremos?", desabafa. Ele ressalta também que em pelo menos duas ocasiões servidores da prefeitura teriam confirmado que a área se tratava de uma APP e que ali "ninguém iria fazer nada".
Há uma placa na cerca instalada junto à obra, na qual é apresentada a licença para os trabalhos. Os fiscais irão verificar, porém, se não houve alguma irregularidade, ou seja, se a intervenção não estava indo além do autorizado pelo Poder Público. "Inclusive, a liberação seria para usar tubos de um metro e meio, mas estão usando uns bem inferiores. Nem isso eles respeitaram", finaliza Medin.
O que diz a prefeitura de Bento Gonçalves
No final da manhã desta segunda feira, 4 de julho, a equipe de Fiscalização da Secretaria Municipal de Meio Ambiente recebeu denúncia de supostas irregularidades em escavação localizada na localidade de Linha Leopoldina. A equipe de Fiscalização e Licenciamento da SMMAM foi deslocada para atendimento, acompanhada inclusive de soldados da PATRAM.
No local, foi constatada a execução de canalização de curso d'água, em desconformidade com a Licença emitida pela SMMAM, em junho de 2021. Foi elaborado o Boletim de Ocorrência junto a Delegacia de Polícia, resultando no embargo da obra.