Indignado com a soltura de seis dos oito indivíduos presos na última segunda-feira, dia 13, com mais de 300 quilos de maconha em Bento Gonçalves, o promotor Manoel Figueiredo Antunes criticou duramente a postura da 1º Vara Criminal do município, comandada pela juíza Fernanda Ghiringuelli de Azevedo. Em entrevista coletiva realizada no começo da tarde desta quarta-feira, 15, Antunes falou que "em um primeiro momento, precisa estimular o trabalho da Brigada Militar e da Polícia Civil", mas que desde o dia da prisão "já sabia de antemão qual seria a providência do juízo em razão das reiteradas condutas que vêm sendo adotadas".
Sob os argumentos de que a operação da Brigada Militar foi ilegal, por não contar com um mandado de busca e apreensão, e que alguns dos indivíduos não tinham antecedentes, a magistrada autorizou a saída da maioria deles do presídio menos de 24 horas depois do flagrante. "O crime vai ficar esperando o mandado? Por isso que a constituição abre essa possibilidade (de invasão do imóvel no caso de um crime estar sendo cometido no local), porque sabe que o crime é rápido, é eficaz. Enquanto as instituições não forem rápidas e eficazes, as organizações criminosas continuarão se fortalecendo. Se a atitude da Brigada Militar foi ilegal, porque a droga não foi devolvida? Ou seja, há ciência da legalidade da atitude. E mais: primariedade e bons antecedentes não são salvo conduto para a prática delitiva", ressalta o promotor.
Em seu despacho, a juíza também determinou que a Corregedoria da Brigada Militar investigue a ação dos policiais. "Essa é a postura que nos deixa mais estupefatos, porque enquanto a palavra dos policiais não serve para determinar a homologação do flagrante e a prisão preventiva dos autores do crime, a palavra dos criminosos serve para instaurar um procedimento contra os próprios policiais. Então, me parece que há um desequilíbrio de valores", completa Antunes.
Na avaliação do promotor, o que está acontecendo "é uma completa distorção da técnica jurídica com um objetivo simplesmente não compreensível". "Aqui em Bento, algumas decisões pontuais que não correspondem ao entendimento geral dos tribunais são adotadas como paradigma e, a partir deste paradigma, decisões de soltura em bloco vão sendo tomadas. Não se pode aceitar que mais de 300 quilos de drogas sejam apreendidos e, em menos de 24 horas, seis dos oito presos estejam soltos. Isso é colocar a sociedade em risco. Isso é inibir e desprestigiar o trabalho não só do Ministério Público, que é a ponta da corda, é onde todo o trabalho das polícias vem parar. E, se houvesse erro, nós já teríamos apontado", destaca.
Nesse sentido, ele diz ainda que "há um núcleo ideológico dentro do Judicário que entende que a prisão não resolve". "Mas enquanto o criminoso está preso, ele não está cometendo crimes. Então, prisão resolve, sim", pondera. Antunes reitera que, em Bento Gonçalves, "essa é uma postura específica do juízo da 1ª Vara Criminal. E isso gera o desconforto de ficarmos torcendo para o processo ser distribuído para outra Vara.
O representante do Ministério Público Estadual (MPRS) salienta também que, neste caso em questão, há um contexto maior relacionado às facções que disputam espaço na cidade e a todo cenário de criminalidade gerado a partir disso. "Há uma banalização do mal. Estamos falando de criminalidade organizada, nós estamos falando de defesa de território, estamos falando de um incremento puro de violência, de morte, de assassinato, nós estamos falando de milhões e milhões de reais de um negócio altamente lucrativo e altamente destruidor de famílias. Se não atacarmos na ponta, esse ápice de violência vai bater na porta de todo mundo. Isso não pode ser romantizado, não pode ser banalizado", alerta.
Por fim, o promotor explica que, devido à burocracia dos trâmites judiciários, os recursos apresentados pelo promotoria tendem a demorar no mínimo de seis a oito meses para serem apreciados. Mesmo assim, vários deles têm tido resultado positivo às demandas do MPRS, restabelecendo prisões. Nesta situação da apreensão dos mais de 300 quilos de maconha, o promotor tentará ingressar com uma medida cautelar diretamente no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), para acelerar o processo, mas não há qualquer garantia de êxito.