O ex-vereador de Porto Alegre Valter Nagelstein (PSD) foi condenado pelo crime de racismo por conta de um áudio enviado por WhatsApp no qual ele criticava a eleição de vereadores negros no pleito de 2020, quando foi candidato a prefeito. A decisão de primeira instância impôs pena de dois anos de reclusão em regime aberto, mas foi substituída por prestação de serviços à comunidade e pagamento de multa de 20 salários mínimos, além de uma multa adicional.
Nagelstein, que atualmente dirige o Instituto de Previdência dos Servidores de Canoas (Canoasprev), afirma que vai recorrer da decisão (confira no final da matéria).
No áudio, enviado a um grupo com outros candidatos e apoiadores, o então candidato comenta a eleição de "cinco vereadores do PSOL, muitos deles jovens, negros" e "sem nenhuma tradição política, sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal". Ele se refere aos vereadores Bruna Rodrigues (PCdoB), Matheus Gomes (PSOL), Karen Santos (PSOL), Daiana Santos (PCdoB) e Laura Sito (PT), todos eleitos pela primeira vez em 2020.
Na sentença proferida no dia 4 de março, o juiz Sidinei Brzuska, da 3ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, afirma que "a cor da pele (...) relacionada aos negros não têm o condão de torná-los menos capacitados ao cargo – e acreditar nisso, por qualquer razão, é defender a supremacia branca". "Para todas as demais expressões, existem argumentos lógicos que podem atrelá-los à ideia de inexperiência: seja pelo decurso do tempo, seja pela vivência ou pela falta de experiências, etc. Para a expressão negros, entretanto, não há nada que possa justificar o vínculo à crítica quanto à falta de preparo", argumenta o magistrado.
O juiz diz ainda que "o fato de ser o pai de Valter negro não o impõe imunidade que torne impossível ter o réu proferido palavras racistas. Se assim o fosse, não teríamos negros que utilizam expressões racistas, gays que utilizam expressões homofóbicas ou mulheres que utilizam expressões machistas".
A denúncia foi oferecida pelo Ministério Público e aceita pela Justiça em abril do ano passado. A Polícia Civil abriu inquérito após uma notícia-crime enviada pela Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, a pedido do Movimento Negro Unificado, subscrito por outras 40 entidades.
Em nota à imprensa, Nagelstein condena "o judiciário e a educação tomados por ideologia" e diz que "isto sim põe a democracia em risco, porque criminalizam a nossa forma de pensar e impõem aos nossos filhos o que é certo ou errado segundo a visão de militantes".
Também em nota à imprensa, o vereador Matheus Gomes, que participou da ação como assistente de acusação, considera a condenação, segundo ele "a primeira de um político por crime de racismo no RS", um "fato histórico" e "uma vitória da luta contra o racismo, pois Valter Nagelstein proferiu palavras que incentivaram a desqualificação de pessoas negras, elemento que está na raiz da violência racial".
O que Valter Nagelstein disse no áudio:
"Gente, bom dia a todos. Primeiro lugar, muito obrigado, é o Valter que 'tá' falando, pelo apoio que tive e rapidamente queria fazer duas ou três reflexões com vocês. A primeira delas: fica cada vez mais evidente que a ocupação que a esquerda promoveu nos últimos quarenta anos da universidade, das escolas, do jornalismo e da cultura produzem os seus resultados. Basta a gente ver a composição da Câmara: cinco vereadores do PSOL, muitos deles jovens, negros, quer dizer, o eco àquele discurso que o PSOL foi incutindo na cabeça das pessoas. Pessoas... vereadores estes sem nenhuma tradição política, sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal. Então, essa é a primeira reflexão que eu queria fazer."
Nota de Valter Nagelstein:
Sou neto de uma negra e de um judeu fugido da guerra, circunstâncias que jamais omiti e que trago como partes de mim, com orgulho, como mostra um poema que fiz aos meus avós em 2009 - e que foi publicado na minhas redes sociais então, e trazido a esse absurdo processo.
Recebo a sentença com profunda tristeza, porque mostra exatamente o que tenho denunciado, o judiciário e a educação tomados por ideologia. Isto sim põe a democracia em risco, porque criminalizam a nossa forma de pensar e impõem aos nossos filhos o que é certo ou errado segundo a visão de militantes.
Recorrerei junto com meus advogados e sigo acreditando na justiça imparcial, aquela que aprendi a ver o meu pai, como magistrado, perseguir e aplicar.
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