Com potencial para liberar R$ 108,4 bilhões em gastos federais no próximo ano, a emenda constitucional que permitiu o parcelamento do pagamento dos precatórios (dívidas do governo reconhecidas em caráter definitivo pela Justiça) representou a principal mudança nas contas públicas em 2022. O texto original foi promulgado em duas etapas, uma no dia 8 de dezembro, com os pontos aprovados pela Câmara e pelo Senado, e outra no dia 16, com os artigos alterados pelo Senado e votados novamente pelos deputados.
O espaço fiscal virá de duas fontes importantes. A primeira é a mudança da fórmula de cálculo do teto federal de gastos. Até agora, os limites anuais eram corrigidos pela inflação oficial pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado entre julho de dois anos atrás e junho do ano anterior.
Com a mudança, o teto passará a considerar o IPCA efetivo dos seis primeiros meses do ano e as projeções para a inflação nos seis meses finais do ano. Com a inflação em alta em 2021, a nova fórmula de cálculo libera R$ 64,9 bilhões no Orçamento do próximo ano, segundo nota técnica da Câmara dos Deputados.
Aprovada sem alterações pelo Senado, a alteração no teto de gastos compôs a primeira parte da PEC promulgada pelo Congresso no último dia 8. O próprio texto especificou que os R$ 64,9 bilhões pela mudança poderão ser usados somente no pagamento das despesas de saúde, previdência e assistência social, o que inclui o Auxílio Brasil de R$ 400. Parte desses gastos cobrirão a correção das aposentadorias e pensões, maiores que o inicialmente previsto por causa da alta da inflação.
A segunda parte da PEC, que tratava do parcelamento dos precatórios, foi alterada pelo Senado e voltou para a Câmara. Essa parte do texto liberou R$ 43,56 bilhões em dívidas de grande porte que tiveram o pagamento adiado. Desse total, R$ 39,48 bilhões estão dentro do teto de gastos e vinculados à seguridade social e ao Auxílio Brasil e R$ 4,08 bilhões estão fora do teto, sem nenhuma restrição, segundo o substitutivo aprovado pelo Senado.
Com a emenda constitucional, os precatórios passarão a obedecer à seguinte ordem de pagamento:
- requisições de pequeno valor (RPV), precatórios de até 60 salários mínimos para a União (R$ 66 mil em valores de 2021);
- precatórios de natureza alimentícia (salários, indenizações ou benefícios previdenciários) até três vezes a RPV cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham a partir de 60 anos de idade, ou sejam portadores de doença grave ou pessoas com deficiência;
- demais precatórios de natureza alimentícia até três vezes a RPV;
- demais precatórios de natureza alimentícia além de três vezes a RPV;
- demais precatórios.
Um dos pontos de maior negociação diz respeito aos precatórios do antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Pelo texto, as dívidas relativas a esse programa ficarão fora do teto de gastos e do limite de pagamento anual de precatórios.
Os precatórios do Fundef serão pagos sempre em três parcelas anuais a partir da expedição: 40% no primeiro ano, 30% no segundo ano e 30% no terceiro ano. Dessa forma, as dívidas que venceriam em 2022 serão pagas em 2022, 2023 e 2024. Os estados e os municípios deverão aplicar 60% dos recursos obtidos com os precatórios do Fundef na forma de abono aos profissionais do magistério, ativos e inativos, sem a incorporação nos salários, nas aposentadorias e nas pensões.
Em vez de 2036, data do fim do regime fiscal de teto de gastos, a PEC aprovada determina a aplicação do parcelamento de precatórios até 2026. Pela regra geral, o total de precatórios a pagar em cada ano será corrigido pelo IPCA do ano anterior, inclusive restos a pagar quitados. Desse total, serão descontadas as requisições de pequeno valor (até 60 salários mínimos no caso da União), que não entram no teto.
O credor de precatório não contemplado no orçamento poderá optar pelo recebimento em parcela única até o fim do ano seguinte se aceitar desconto de 40% por meio de acordo em juízos de conciliação.
No próximo ano, os valores não incluídos no orçamento serão suportados por créditos adicionais abertos em 2022. As mudanças valem principalmente para a União, mas algumas regras se aplicam também aos outros entes federados, que continuam com um regime especial de quitação até 2024, conforme a Emenda Constitucional 99, de 2017.
*Com informações das Agências Câmara e Senado
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