Na religião, com a história de igrejas e capitéis; no esporte, com a trajetória do piloto Aristides Bertuol e o centenário Clube Esportivo; e também na arte, com fotos e poesias: é assim que Fabiano Mazzotti, através de suas obras, dialoga diretamente com a história de sua cidade natal, Bento Gonçalves. Agraciado pela medalha Aristides Bertuol pela Câmara de Vereadores este ano, o jornalista e fotógrafo propaga a construção da memória da cidade e, sobretudo, da identidade cultural da Capital Brasileira do Vinho.
Prova da relevância de suas obras para o cenário cultural é o último livro lançado, “130 + 1: Bento Gonçalves em Preto & Branco”, produção que foi construída coletivamente com 130 alunos de escolas da cidade e com o apoio de 130 empresas do município, oportunizando jovens talentos a sintonizarem suas experiências com o município no qual vivem, assim como fez o próprio Fabiano Mazzotti quando ingressou no cenário cultural.
Fabiano não se considera um escritor, mas sim um jornalista e fotógrafo que organiza livros com conteúdo local. “Ingressei nesse universo por analisar o cenário onde eu vivo, que é Bento Gonçalves. Identifiquei uma carência de livros com conteúdo local e forte apelo visual e fui buscar uma solução. Isso foi o que me motivou a estar nessa trajetória cultural”, explica.
As obras têm forte apelo visual e registram locais, pessoas e acontecimentos relacionados à construção da memória de Bento Gonçalves. “Não sou um historiador, sou um jornalista que procura histórias. A história é extremamente importante e ela tem necessidade de ser registrada. Se esse tempo passado não é registrado acaba desaparecendo, pois se desgasta na memória das pessoas. Entendo que o passado tem significado no presente, para que possamos compreender os fatos que ocorrem hoje. Respeito demais os degraus que tem atrás dos nossos passos”, pondera.
A partir da proximidade significativa com o município, por ser bento-gonçalvense, Mazzotti busca imagens históricas por meio de uma ampla pesquisa. Ele explica que não almeja alcançar grande repercussão fora da cidade por compreender que existe a necessidade de uma produção de livros com conteúdo local, que circulem no lugar sob o qual estão inseridos. “Tem uma frase de Leon Tolstói que diz assim: ‘cante a sua aldeia e serás universal’”, cita.
A produção das obras Amém Bento Gonçalves — Igrejas e Capelas desta Terra, Aristides Bertuol — O Piloto da Carretera N° 4, O Livro do Capitel e Um Século Alviazul demandou ampla pesquisa, sobretudo a partir de entrevistas com pessoas e personagens da comunidade de Bento. Mazzotti estima que tenha conversado com mais de mil pessoas para construir essas obras, que ao final trazem sempre o nome dos entrevistados. Em suas próximas produções, que também vão exigir amplo estudo, Mazzotti vai falar sobre os 55 anos da Fenavinho e, posteriormente, sobre o Aeroclube de Bento Gonçalves.
O jornalista explica que há uma significativa preocupação em levar essas histórias ao conhecimento do público. “As obras talvez tenham tido essa visibilidade em razão de eu compreender que o livro não é para mim. Eu estou aqui única e exclusivamente na condição de um trabalhador com essa atividade. Quando deixo um produto pronto, me preocupo muito em dar visibilidade a ele para que seja de conhecimento das pessoas, para que elas possam adquirir a informação e transmitir às próximas gerações”, explica.
Mazzotti já organizou dois livros com fotografias e poesias. O livro 130 + 1: Bento Gonçalves em preto & branco comprova que o jornalista não apenas resgata a história do município, mas também fomenta o cenário cultural de Bento Gonçalves.
Para este trabalho, Mazzotti promoveu um concurso cultural com alunos de diversas escolas estaduais e municipais. Os estudantes receberam fotografias produzidas pelo jornalista e precisavam escrever um texto de 130 caracteres acerca da imagem. Diferente de suas outras publicações, que utilizaram a Lei de Incentivo à Cultura, desta vez Mazzotti buscou financiamento direto junto à 130 empresas apoiadoras, fazendo jus ao número do aniversário da cidade.
“Foram 130 fotos de Bento, acompanhadas por 130 textos de 130 alunos de escolas. Então fui atrás de 130 empresas para viabilizarem o trabalho. Foi um desafio gigante e uma grande peregrinação, pois muitas pessoas te recebem como um pedinte de dinheiro. Então, acabei evoluindo nesse processo de captação de recursos. Me profissionalizei para captar os recursos”, afirma. Mazzotti, além da formação em jornalismo, estudou contabilidade para, como ele mesmo diz, ser empresário de si mesmo.
Dentre as empresas que praticamente sempre apoiaram as obras de Mazzotti está a Meber Metais, de Bento Gonçalves. “Apoiar projetos culturais é uma importante forma de contribuição que a iniciativa privada pode – e deve – exercer em prol do desenvolvimento social. Iniciativas como as protagonizadas pelo autor Fabiano Mazzotti enriquecem a bagagem intelectual disponível para a comunidade e são, assim, relevantes legados que preservam a história e a cultura de Bento Gonçalves. Por isso, são merecedores de incentivo", pondera o diretor da empresa, Carlos Bertuol.
O livro estava previsto para ser lançado em 2020, mas por conta da pandemia o projeto foi adiado para este ano. Então, Mazzotti buscou um novo significado ao número 130, que se tornou 130 +1. “Tinha todo um simbolismo que junto se é mais forte. Essa foi a intenção do 130 +1. Já tenho a obra pensada para daqui 10 anos. Estou lapidando o diamante”, ressalta.
Para a professora da Escola Estadual de Ensino Fundamental Pedro Vicente da Rosa, Márcia Iunes, a oportunidade que os alunos receberam foi de grande valia para mostrar o esforço dos profissionais de ensino, sobretudo em um período no qual há dificuldades para se promover a educação. “A imagem é poesia para olhares apurados. Ela se transforma em emoção e gera sentimentos. Assim posso definir a obra do Fabiano Mazzotti, que em cada detalhe fotográfico, constrói memória e amor por sua cidade. E ter a coragem de entregar suas imagens para serem transformadas em poesias, feitas por jovens cidadãos em suas escolas, revela o papel da educação”, comenta Márcia.
O projeto entregou 130 Kindles — leitor de livros digitais — para os alunos que tiveram seus textos publicados, como forma de incentivo à leitura. A obra também circula com uma marca expressiva de acessibilidade, que foi incorporada nas últimas obras do autor. Deficientes visuais têm contato com o conteúdo por meio de QR Code, em cada página, que permite acesso à descrição das fotos e narração dos textos no formato de áudio. O livro também foi traduzido para três línguas: italiano, espanhol e inglês.
Mazzotti explica que a importância da obra não está no resultado, mas sim na produção. “Tinha essa questão coletiva de marcar os 130 anos da cidade. Observar que dentro das escolas há talentos, dar a oportunidade para que esses talentos ganhem luz e estimular a leitura de maneira moderna. Fiquei muito feliz por ter sido recebido muito bem pelas escolas. A grandeza do trabalho não está no livro físico, e sim no processo”, comenta o jornalista.
O secretário de Cultura e presidente da Fundação Casa das Artes de Bento Gonçalves, Evandro Soares, enalteceu a dedicação do jornalista em registrar mais uma data importante do município por meio de uma obra que sintoniza a juventude com a cidade. “Há mais de uma década ele vem incentivando a arte e cultura. Em suas obras, há uma participação de pessoas que compõem a história da nossa cidade com as suas ações e com aquilo que deixa de legado. E esta obra em específico é um legado para o futuro. Já posso falar que estes 130 alunos já são escritores”, salienta.
Se no início de trajetória, o jornalista preencheu uma importante lacuna cultural em Bento Gonçalves, os alunos tinham, agora, o mesmo dever. Porém, com a missão de preencher uma folha com 130 caracteres sobre o município. “Lá em 2010, vi que tinha um espaço em branco a ocupar. Nessa obra os alunos tinham um espaço em branco a preencher, fica a analogia. No andar da carruagem, percebe-se que é necessário esse tipo de obra. A pessoa que consome arte será um colaborador melhor na empresa, será um pai ou uma mãe melhor, vai ser mais agradável na roda de amigos, e isso se deve ao consumo de diferentes expressões artísticas”, comenta Mazzotti.
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