Bento Gonçalves completou, nesta quarta-feira, 18, cem dias de inclusão de dados no sistema Sipia, que reúne estatísticas sobre violação de direitos de crianças e adolescentes. Desde 11 de maio, as informações relacionadas ao município estão sendo inseridas no programa pelo Conselho Tutelar local e revelam um alarmante cenário: neste período, foram registradas 485 ocorrências, sendo que 101 delas se referem a situações de abuso sexual.
Dessa forma, considerando apenas as notificações que chegam aos órgãos responsáveis, já que muitas são omitidas inclusive pelas próprias famílias, a Capital do Vinho teve, neste período, ao menos um caso diário de abuso sexual de crianças ou adolescentes. Destes, sobressai um fator ainda mais preocupante, pois 35 casos foram praticados por uma pessoa da família.
No contexto geral detalhado na tabela abaixo, que contabiliza quase cinco casos por dia de violação de direitos de menores de idade na Capital do Vinho, os bairros com maior incidência são Vila Nova II (52), Ouro Verde (42), São Roque (40), Aparecida (40) e Conceição (28). Em cada comunidade, há diferentes realidades apontadas pelos números, ou seja, as violações que estão em evidência negativa em determinados locais podem não ser, necessariamente, as mesmas de outros. E, a partir de uma única denúncia, também pode-se constatar que a mesma criança tenha vários direitos violados simultaneamente.
Pioneiro no RS
O Conselho Tutelar de Bento é um dos pioneiros no Rio Grande do Sul a usar o Sipia e o único, até aqui, a aderir integralmente a esta nova ferramenta de trabalho digital. A mudança de rotina ao longo dos últimos meses deu fim aos processos físicos e à infinidade de pastas e papéis reunidos em cada procedimento aberto no órgão.
Além disso, a utilização da plataforma permite traçar um panorama mais fiel dos desafios a serem enfrentados na proteção das crianças e adolescentes da cidade. "Essa é uma questão muito importante com relação a esse sistema. As demandas vão mudando conforme o bairro e, com essas informações, o Poder Público pode pensar em políticas públicas específicas, é só querer agir pontualmente nessas áreas. Digamos que a intenção seja construir uma nova escola de tempo integral, então, é preciso dar prioridade para os bairros que realmente tem esse déficit na educação. E não fica restrito ao Executivo, vale também para o Legislativo, quando analisar projetos, e até para o Judiciário, em uma decisão relacionada a alguma ação civil pública, por exemplo", destaca o conselheiro Leonides Lavinick, que atua ao lado de Simone Lunelli (coordenadora), Silvana Lima (vice-coordenadora), Gabriela Ferreira (secretária) e Analu Meneghetti, que assumiu a função nesta semana.
Lavinick salienta ainda que, com o retorno das aulas presenciais que começa a ganhar mais força, alguns índices tendem a subir expressivamente. Um deles é o das Fichas de Comunicação de Alunos Infrequentes (Ficais), que são produzidas pelas escolas. "Antes da pandemia, tínhamos mais de mil Ficais por ano. As demandas de educação sempre estiveram em primeiro lugar nos números, tanto com relação a negligência dos pais quanto do próprio Estado", ressalta.
Mas esse crescimento também deverá ser verificado no que diz respeito aos casos de violência, em suas mais variadas formas, que muitas vezes são identificados e informados pelas próprias escolas. "Hoje, as denúncias estão vindo principalmente por meio de pessoas que testemunham estas situações e denunciam ou pelos atendimentos no setor da Saúde, porque muitas crianças que estão sofrendo não estão indo para a escola, estão fazendo aulas remotas. E a maioria dos casos de direitos violados é intrafamiliar, dentro de casa", completa o conselheiro.
Nos mesmos 100 dias de adesão ao Sipia, o Conselho Tutelar de Bento Gonçalves cadastrou 629 crianças e 480 responsáveis no sistema. A discrepância ocorre pelo fato de poder haver mais de um menor no mesmo círculo familiar tendo seus direitos violados. O acesso aos registros completos é sigiloso, permitido apenas para os conselheiros, mas também pode auxiliar em casos nos quais uma família investigada eventualmente se mude para outro lugar, até mesmo outro estado brasileiro. "No momento em que a maioria das cidades aderirem, vai ser muito bom porque vai ser possível ver o histórico dessa família de qualquer lugar do país", conclui Lavinick.
AS VIOLAÇÕES REGISTRADAS EM 100 DIAS:
Mín. 13° Máx. 29°