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Abordagem de ambulante no Centro gera indignação

Guarda Civil Municipal ressalta que agiu sem cometer quaisquer excessos, atuando apenas para evitar que os servidores do município fossem agredidos pelos vendedores

16/12/2020 às 18h54 Atualizada em 21/12/2020 às 10h48
Por: Marcelo Dargelio Fonte: Jorge Bronzato Jr./NB Notícias
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Reprodução Facebook
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Uma abordagem a um vendedor ambulante realizada na rua Marechal Deodoro, no Centro da cidade, nesta terça-feira, dia 15, causou indignação em pessoas que passavam pelo local e filmaram a cena – e que acabaram publicando, na sequência, os vídeos em postagens no Facebook. As gravações que até o momento se tornaram públicas não mostram a atuação completa dos fiscais e dos agentes da Guarda Civil Municipal, e trazem comentários a respeito do fato por parte de alguns cidadãos que acompanharam a movimentação.

Em uma delas, QUE PODE SER CONFERIDA AQUI, a mulher que registra o ocorrido afirma que "o rapaz haitiano estava trabalhando direitinho" no momento em que foi abordado (segundo apurado pela reportagem, trata-se de um senegalês). Ela aponta que a ação dos servidores da prefeitura foi truculenta e que houve intervenção de alguns populares para evitar que ele fosse mais agredido. "O povo se revoltou, o mulherio não deixou baterem nele, porque eles começaram a bater. Derrubaram o coitadinho que 'tava' trabalhando e levaram a mochila dele. Empurraram, chutaram, não bateram mais porque as mulheres não deixaram. Onde já se viu isso, Bento Gonçalves, uma cidade que aconchega a todos, maltratar os haitianos. Isso não pode acontecer", diz a mulher enquanto filma com o seu celular.

Ela, assim como outros que se encontram próximos, também criticam o recolhimento das mercadorias. Em outro vídeo postado nos comentários da mesma publicação, é possível ver os agentes da GCM tentando retirar outros produtos que pertenciam ao ambulante, mas, diante da resistência dele e de manifestações das pessoas que estavam no entorno, desistem e vão para a viatura.

O QUE DIZ A GCM
O comandante da Guarda Civil Municipal, tenente Clóvis Lavarda, ressalta que a presença dos agentes em ações deste tipo ocorre, prioritariamente, com o intuito de preservar a integridade física dos fiscais da prefeitura. "A ação da Guarda é no sentido de preservar o direito e a obrigação de os fiscais do município executarem suas funções, pois infelizmente é corriqueiro que haja algum tipo de ameaça a eles. E isso não se restringe somente às questões de comércio ilegal, pois damos o mesmo suporte para a fiscalização de meio ambiente, de obras, de trânsito, sempre que necessário", pontua.

Lavarda complementa que, na ocorrência que acabou sendo postada na internet, a intervenção da GCM não teve excessos e garantiu a segurança dos servidores. "No cumprimento de sua tarefa, os fiscais foram hostilizados e impedidos de completar os trâmites administrativos de apreensão de mercadoria. Ao se sentirem ameaçados de agressão física, pediram auxílio aos servidores da GCM que ali estavam para segurança pessoal desses fiscais. Uma vez garantida a integridade física de todos, saíram do local.  Os fiscais fizeram apreensão de parte das mercadorias de um dos vendedores que correu ao ver a aproximação da equipe", relata.

Sobre as eventuais críticas que, em situações deste tipo, muitas vezes são direcionadas à Guarda Civil Municipal, Lavarda conclui que essa parcela de rejeição é fruto de o efetivo ainda ser uma novidade na cidade. "Antes, não tínhamos uma força de segurança do município para dar esse suporte às demais secretarias em operações de fiscalização, então, é algo novo, que ainda está sendo assimilado pela comunidade. Essa responsabilidade da GCM em prestar segurança aos serviços próprios do município, suprime a necessidade de pedir auxílio e onerar outros órgãos e instituições de segurança, principalmente em trabalhos de baixa e média complexidade. Todo o trabalho ordinário é previamente planejado e com constante análise de resultados e revisão de atitudes", acrescenta.

Por fim, o comandante reforça que, se qualquer pessoa entender que a GCM cometeu alguma falha ou excesso, estão à disposição da população tanto a Ouvidoria quanto a Corregedoria da Guarda Civil Municipal, voltadas a identificar e apurar exclusivamente estas questões que venham a ser levantadas.

O QUE DIZ A SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
A secretária de Desenvolvimento Econômico, Milena Bassani, relata que a fiscalização no caso em questão ocorreu após uma denúncia anônima. Ela destaca que, inicialmente, "a abordagem é sempre orientativa". Havendo resistência ou algum tipo de agressão aos fiscais, conforme Milena, há o recolhimento da mercadoria e o responsável é orientado à comparecer posteriormente ao departamento. "Em relação às mercadorias, existem duas possibilidades: se não tem Nota Fiscal de compra, com a origem, existe a possibilidade do pagamento da multa e, com isso, a devolução das mesmas. Caso isso não ocorra, após um período, elas são destinadas a entidades", explica.

"É UM ASSUNTO COMPLEXO E A DISCUSSÃO NÃO PODE SER RASA", AVALIA MOVIMENTO NEGRO RAÍZES
Na avaliação do coordenador do Movimento Negro Raízes, Marcus Flávio Dutra Ribeiro, por mais que a ação de fiscalização possa ser considerada legítima em função de lei municipal que proíba o trabalho de ambulantes em Bento Gonçalves, é preciso estabelecer iniciativas que criem mais oportunidades para estes trabalhadores, em sua maioria migrantes haitianos e senegaleses, a fim de fazer com que eles tenham condições de sair da informalidade.

Segundo ele, este tema já foi levantado, inclusive, junto a entidades que representam os lojistas, de forma a tentar se buscar uma alternativa conjunta para o problema. "Compreendo o pleito dos comerciantes, mas, em sentido inverso, o que estamos fazendo por essas pessoas? Estamos empregando migrantes no comércio? Não é o que se vê, com exceção de alguns poucos em supermercados. Tem sido oferecido cursos de aperfeiçoamento para que essas pessoas se insiram, de fato, no mercado de trabalho? Ou vamos continuar vendo os migrantes só lá no caminhão da coleta de lixo ou no frigorífico em Garibaldi, sendo que muitos, inclusive, com formação superior e falando no mínimo dois idiomas além do Português? Talvez, seja esse o questionamento. É um assunto complexo e a discussão não pode ser rasa, ela tem que ser ampla e com muitos envolvidos", salienta.

Uma sugestão que o Movimento pretende debater mais profundamente com os órgãos públicos é a criação de uma cartilha – devidamente traduzida – que aborde as restrições ao comércio ambulante previstas na lei municipal. O objetivo é permitir que o material possa auxiliar no entendimento da realidade local que muitos migrantes ainda não têm, principalmente por obstáculos impostos pelos diferentes idiomas e pela falta de informação mais clara no que se refere à legislação local que trata do assunto.

Nesta quarta-feira, dia 16, uma reunião coordenada pelo Núcleo de Ação Social (NAS) e pela Secretaria de Segurança, e que contou com a representante do Movimento Negro Raízes Lisiane Pires, abordou o tema de forma preliminar. Outra medida que foi discutida no encontro é a oferta de aulas de Crioulo e Francês para os agentes da Guarda, para propiciar uma aproximação maior por meio da língua, como já ocorre de modo semelhante com haitianos e venezuelanos.

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