Quando deu início à coleta de lixo eletrônico em Bento Gonçalves, em 2010, a Associação Ativista Ecológica (Aaeco) projetava que a atividade poderia durar de dois a três anos, até o recolhimento e a destinação do passivo acumulado em residências e empresas da cidade. Hoje, uma década depois, a demanda atingiu certa estabilidade, mas em um patamar consideravelmente alto: por ano, a organização não-governamental dá o encaminhamento adequado a uma média de 50 toneladas do material.
Ao longo desse período, a atuação da Aaeco impressiona pelos números e, obviamente, pelo impacto positivo gerado no meio ambiente. Com o último caminhão transportado recentemente, o total carregado desde o início da campanha até o final de agosto deste ano é de 575 mil quilos. Todo o lixo eletrônico recebido pela ONG tem como destino, atualmente, uma empresa certificada de Caxias do Sul, a Ambe Gerenciamento de Resíduos.
Nesse meio tempo, a Aaeco perdeu o espaço no qual se tornou referência para a comunidade de Bento e região, que era uma sala localizada junto ao velho Estádio da Montanha. Embora tenha utilizado o local por 11 anos, em parceria durante pelo menos três gestões municipais, em 2018 a prefeitura pediu que as chaves fossem definitivamente entregues. Uma das justificativas para o "despejo" era de que a área seria alienada para a construção do Centro Administrativo, o que nunca ocorreu. "Nós chegamos a ficar vários meses sem recolher eletrônicos, por não termos um novo lugar, mas depois conseguimos voltar e, pelo bom trabalho que vínhamos fazendo, as pessoas seguiram nos procurando", afirma o secretário-geral, Gilnei Rigotto.
Agora, o principal auxílio vem do Ministério Público Federal (MPF), que se comprometeu a pagar o aluguel da nova sede por cinco anos. Mesmo em meio à pandemia, somente em 2020 a entidade já despachou 27 toneladas de resíduo eletrônico para a empresa especializada. Na avaliação de Rigotto, inclusive, o próprio contexto local transformado pela Covid-19 tende a refletir, em breve, em um provável aumento no descarte deste tipo de resíduo, já que muitas pessoas – inclusive pelo novo formato de trabalho home-office – tem investido na aquisição de novos equipamentos. "A isso, também somamos a tradicional obsolescência programada destes aparelhos e a falta de logística reversa por parte de grandes empresas", salienta o ambientalista.
Doações e vendas
É do recebimento do lixo eletrônico que vem, também, a oportunidade de ajudar a quem precisa. Muitos dos artefatos entregues na ONG ainda estão em bom estado e funcionando, e acabam se tornando itens de doação para famílias de baixa renda, instituições filantrópicas e escolas públicas. Em 2019, por exemplo, estes repasses se repetiram 139 vezes, levando desde microondas até roçadeira para as mãos de quem seguiria dando bom uso aos objetos.
Em outros casos, algumas das mercadorias entregues também são comercializadas a interessados, por preços bem abaixo de qualquer venda convencional. A prática já chegou a gerar algumas críticas, mas Rigotto explica que o objetivo é justamente ajudar a angariar recursos para a Aaeco. "Não vendemos para ter lucro ou tirar vantagem. Fazemos isso para custear despesas da ONG e nos mantermos de pé. Não tem nada de errado nisso e não precisamos esconder. Mas sempre tratamos as doações como prioridade", destaca.
Se, por um lado, o ecologista viu crescer o engajamento da população, por outro, ainda há situações que incomodam e demonstram que nem todos estão cientes das suas responsabilidades em termos coletivos, mesmo com a possibilidade de um grande acesso à informação. "Eu vi, aqui mesmo na rua Livramento, onde a Aaeco está instalada, uma televisão largada na calçada para ser recolhida pelo lixo. E aí, em contraponto, vem um cidadão de Farroupilha com o porta-malas do carro cheio de lixo eletrônico para entregar na entidade. Uma pessoa não faz 50 metros, mas o outro faz vários quilômetros. Existem os poderes e as instituições, mas a sociedade civil também tem a sua responsabilidade. Essas partes do todo têm que fazer a sua função e fiscalizar os demais. Não tem um lado ou outro que possa fazer isso tudo sozinho", analisa.
Orientação ambiental
Diariamente, a entidade é procurada para as mais variadas formas de orientação ambiental, desde informações acerca dos procedimentos corretos para plantar ou podar árvores, até questões relacionadas a licenciamentos e denúncias. Mesmo não estando à frente de muitas destas atribuições, todas as explicações e encaminhamento são fornecidos e, para facilitar esta tarefa, foram impressos pequenos cartões com telefones úteis de vários órgãos vinculados ao meio ambiente.
Calçada verde
Por conta própria, mas seguindo as diretrizes do manual de arborização urbana, a Aaeco tem feito o plantio de várias mudas junto ao passeio público de vias como a Livramento e a Osvaldo Aranha. Intitulada "Calçada Verde", a iniciativa busca ampliar a presença de árvores nestas áreas, o que depois seria difundido para outros pontos de Bento, sempre com o consentimento de moradores e comerciantes. Nos últimos dias, contudo, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Smmam) enviou um ofício à ONG, questionando de onde havia partido a liberação para a colocação das plantas. "Só falta que agora pensem em multar a entidade por plantar árvores", lamenta o secretário-geral.
Do lixo ao luxo
Um sonho de Rigotto que ainda permanece em suspenso é a criação do Museu do Eletrônico, inviabilizado, entre outros fatores, pela falta de um espaço adequado. Nele, os mais diversos aparelhos seriam apresentados ao público, que poderia vê-los em funcionamento e conhecer a sua importância histórica. O projeto, quando executado, também deve ganhar um formato itinerante, para circular especialmente por colégios.
É junto aos estudantes, principalmente adolescentes, que a Aaeco desenvolve outra importante atividade no município, com palestras abordando vários aspectos da temática ambiental. A presença do Coronavírus paralisou momentaneamente estes encontros, mas eles serão retomados assim que possível. "Temos que continuar fazendo isso, é uma semente que estamos plantando para o futuro. E no caso dos jovens, é uma fase em que eles estão se descobrindo, estão começando a ter as primeiras responsabilidades maiores na vida. Então, é um bom momento para semear esse ideal ecológico", conclui Rigotto.
ONDE ENTREGAR O LIXO ELETRÔNICO
Associação Ativista Ecológica (Aaeco)
Rua Livramento, 48 – Bairro Juventude (quase na esquina com a Osvaldo Aranha)
Telefones: (54) 9.9105.9514 | (54) 9.9986.8041
E-mail: [email protected]
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